◘ O que deve Mudar na Escola









                      Horário de Recreio


Por: Westerley Santos
                           
        As lições que os escolares aprendem entre sí no pátio do colégio lhes são cem vezes mais úteis do que tudo o que se lhes diga na classe”. (Emílio*. p.120).



No livro Segundo da belíssima obra “Emílo”, Jean-Jaques Rousseau.(1712-1778), faz esse alerta. E está aí um ponto de reflexão para mudança na Escola, o tempo de recreio ou intervalo para os alunos.

Na Escola pública, normalmente o turno da manhã, por exemplo, inicia-se as 7:00h, com cinco aulas de 50 min. Após o terceiro horário (2:30h depois), há um intervalo de 15 min para “recreio”. Neste intervalo de tempo, circulam pelo ambiente escolar de 600 a 700 pessoas, entre alunos, professores e funcionários, lembrando que os prédios da escola pública são pequenos e muitos deles, improvisados para o funcionamento da escola, ou seja, não foram arquitetonicamente planejados para a circulação deste contingente.
Destaque para as cantinas (quando há uma) que não suportam atender os alunos, por falta de espaço físico ou por insuficiência de funcionários para servir a merenda a todo este contingente, em tempo tão exíguo, situação que gera filas imensas de espera.

A mesma situação se vê na tentativa de uso dos banheiros. Na prática, quem vai ao banheiro não merenda ou quem merenda, não vai ao banheiro. Para cumprir as duas necessidades em 15 min, já que haverá mais 1:40h min de aula pela frente, é necessário participar de uma maratona, de um corre-corre, todos os dias, durante todo o ano letivo. Ao fim, o que observamos? Alunos com fome até as 11: 40h ou, alunos que não lancham devidamente. E todos sabem o que isso significa para a aprendizagem e para o processo de ensino.

Mas, quero aqui levantar outro aspecto igualmente importante deste modelo de tempos e espaços escolares. O problema é que professores e gestores escolares, entendem este tempo justamente como “intervalo”, “tempo de descanso”, “ recreação”, “lazer” ( no sentido lúdico e não de ócio). Tudo bem que para os alunos, este tempo escolar tenha esta conotação, mas, para (nós) professores, pedagogos, supervisores, diretores, com formação acadêmica e experiência na área educacional, é preciso ampliar a compreensão sobre este ponto. O recreio não é apenas um intervalo entre aulas, para descanso, lazer ou alimentação.

O recreio é mais que isso! Deve ser visto como uma oportunidade de tempo e espaço para o encontro, a socialização, o convívio, trocas e práticas de relacionamentos em grupos, oportunidade de formação de novos grupos de convivência, conhecimentos e reforço dos laços de amizades entre os alunos.

O recreio é o momento, tempo e espaço que o aluno tem na escola para si, para se relacionar, para exercitar o bom e saudável bate-papo com o outro, seu igual, com seus colegas. Para o enamorar, o flerte, o encantamento da primeira paixão adolescente, muitas vezes para nós adultos, inesquecível! - Porque não? O recreio é onde os alunos se encontram e praticam a relação presencial, é a oportunidade, às vezes única durante o turno, para que discutam suas questões, seus problemas, suas expectativas. É no ‘“intervalo” que os alunos podem exercitar a afetividade, a sociabilidade com os de sua geração. No “intervalo” inclusive, é quando o aluno pode enxergar a escola com outro olhar, um olhar mais amplo, afetivo, detalhado para além das paredes das salas de aula, é o momento da descoberta diária em que o aluno tem a oportunidade de desenvolver um sentimento de pertença e cuidado com a escola.

Diante destas questões penso ser pertinente nos perguntarmos: será que ao limitar esta manifestação natural e necessária do ser humano, não estamos ao mesmo tempo, incentivando os encontros frios e distantes nos facebooks, whatzapps e outros, durante as aulas? Será que ao inibirmos esta manifestação da necessidade humana, de diálogo e exercício mais livre da linguagem, não estaríamos inversamente incentivando a omissão da fala mais elaborada em sala de aula, quando em exercícios de debates e desenvolvimento da oralidade por exemplo, com reflexos negativos inclusive à escrita? Será que ao minimizarmos esta prática de socialização, não estamos inversamente propiciando um ambiente de intolerância com as diferenças, por falta exatamente da prática do convívio e debate interno de suas questões próprias?

É no “intervalo” que o adolescente pode simplesmente ser e fazer as coisas que fazem os adolescentes. Sem que esteja “a serviço do conteúdo lecionado”, dos métodos disciplinares de cada professor ou sob a atenção direcionada de um adulto que exige atenção e comportamentos muitas vezes próprios do mundo adulto.

É preciso entender que o “intervalo de recreio” é também um tempo pedagógico, de aprendizagem, não de conteúdos curriculares, mas de conteúdos sociais. Por isso, um dos pontos que deve mudar nas escolas públicas é o tempo de “intervalo”, passando dos insuficientes 15min. para no mínimo 30min. para começo.

Se entendermos isso, aí sim, estaremos garantindo os tempos e espaços democráticos dos alunos. Estaremos respeitando o tempo de aprendizagem que inclui a prática do convívio social, como elemento imprescindível da natureza humana. - Como disse Aristóteles: o homem é um ser social.






Ref: Bibliográfica: Rousseau, J.Jacques. “Emílio; ou Da educação”; tradução de Sérgio Milliet. – 3. ed. RJ, 1995.



Maio/2015
















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